O Mundo Platônico

O Mundo Platônico

O Mundo Platônico

Vivo, morrendo de amores pelo mundo lá fora. É um amor platônico. Imaculado do cotidiano que lhe desgastaria os cantos, e salvo do convívio que lhe cravaria um defeito insuportável. O meu amor ao mundo, agora pela janela, é tão perfeitamente idealizado que já nem reclamo do vento que desarranjaria os cabelos, ou da chuva que encharcaria o dia.

Um bom amor platônico não sai da gente por distanciamento. Pouco importa que o mundo lá fora tenha dado as costas, pondo-me de castigo e ditando: “Fique em casa.” Pouco conta a solidão de agora, diante do privilégio que foi tê-lo no passado, ao gasto das horas. E mesmo que o futuro seja de outros tempos, tivemos o nosso.

Hoje, sufocada pelas saudades, eu fugi. Disse adeus às paredes brancas, abandonei a segurança do concreto armado. Bati o portão de casa e me encontrei com a rua, porque já era caso de primeira necessidade. Não fui longe, pois o pouco comércio atendia com medo, bancos vazios não dão bons-dias, e o parque silenciava do barulho infantil. O mundo lá fora continuava belo, mas deserto do que lhe dá graça. Não era proibido amar o mundo, entretanto cada novo passo era errôneo.

Foi bom revê-lo, e para salvar-lhe bobo romantismo, voltei ao ponto de vista da minha janela, platônico de céu azul e sol.

 

Foto: Fabrizio Verrecchia



Autor(a): Alice Maria de Medeiros



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